domingo, 2 de junho de 2013

Opinião: tanta austeridade faz bem?

Por Vicente Criscio 

A revista Exame edição 1042, de 29 de maio (aquela que tem o Neymar na capa) traz excelente matéria do jornalista Lucas Amorim.
Com o título "Onde os Amadores não tem vez" a matéria mostra a transformação que vem ocorrendo no futebol brasileiro, saindo a gestão amadora, arcaica, anacrônica, ultrapassada de velhos caciques da política clubística (os adjetivos são meus, e não da Exame) e partindo para a gestão profissional.

Ótima matéria. Sério. E olha que nem sou tão fã assim da Exame. 
Mas o que ela fala? Um pouco do óbvio mas com um certo grau de profundidade, até onde permite 8 páginas de texto e mais umas 7 páginas com quadros e infográficos. 



O jornalista usa como referência central o Flamengo. Prá quem ainda não sabe após a eleição de Bandeira de Melo para a presidência do time carioca, um grupo de empresários, executivos e gestores assumiu o rubro-negro. O primeiro passo foi contratar uma consultoria renomada e fazer uma profunda auditoria nas contas. Depois abriu os números para quem quisesse ver (R$ 750 milhões em dívidas). E começaram a trabalhar. Se vai dar certo ou não, ninguém pode prever, nem eu nem a revista. Mas estão lá, trabalhando.

O Palmeiras? Foi citado apenas duas vezes. A primeira, sobre a Allianz e o contrato com a Arena de 20 anos. A segunda, numa referência antiga à Parmalat, em 1992. Não meus caros. A revista não considera a contratação de um CEO caro e até aqui pouco eficiente, a ingerência do COF na gestão executiva, e os aconselhamentos do Presidente com Carlos Facchina e Mustafá Contursi como provas de uma transformação de mentalidade da gestão. Nem eu!

Mas seguindo em frente. A matéria mostra por exemplo os 10 times com lucro em 2012...

CAP: Receita R$ 213 MM e Lucro de R$ 123 MM;
SEP (depois eu explico): Receita R$ 244 MM e Lucro de R$ 32 MM;
Grêmio: Receita R$ 233 MM e Lucro de R$ 28 MM;
Santos: Receita R$ 200 MM e Lucro de R$ 15 MM;
Internacional: Receita R$ 264 MM e Lucro de R$ 12 MM;
Corinthians: Receita R$ 358 MM e Lucro de R$ 7,5 MM;
Portuguesa: Receita R$ 50 MM e Lucro de R$ 1,5 MM;
Goiás: Receita R$ 49 MM e Lucro de R$ 1,4 MM;
São Paulo: Receita R$ 284 MM e Lucro de R$ 0,8 MM;
Vitória: Receita R$ 52 MM e Lucro de R$ 200 MM;

... e os 10 times com prejuízo:

Flamengo: Receita R$ 212 MM e Prejuízo de R$ 60 MM;
Botafogo: Receita R$ 123 MM e Prejuízo de R$ 49 MM;
CAM: Receita R$ 163 MM e Prejuízo de R$ 53 MM;
Cruzeiro: Receita R$ 120 MM e Prejuízo de R$ 31 MM;
Coritiba: Receita R$ 83 MM e Prejuízo de R$ 8 MM;
Figueirense: Receita R$ 41 MM e Prejuízo de R$ 8 MM;
Fluminense: Receita R$ 151 MM e Prejuízo de R$ 4 MM;
Bahia: Receita R$ 67 MM e Prejuízo de R$ 3 MM;
Náutico: Receita R$ 41 MM e Prejuízo de R$ 1,6 MM;
Vasco da Gama: Receita R$ 139 MM e Prejuízo de R$ 300 mil.

Algumas curiosidades não relatadas na revista (lembrando que esses dados são de 2012; e o cálculo de lucratividade que deveria ser lucro / receita líquida, foi calculado sobre receita bruta que é o que tem disponível aqui):
- O Palmeiras teve lucro porque a WTorre entregou partes da obra da Allianz Parque (prédios administrativo e de quadras) e isso trouxe uma receita não operacional que acabou gerando lucro. Não tenho aqui nas mãos mas o Palmeiras teve um importante prejuízo operacional (pro jargão financeiro, ebitda negativo);
- O SPFC teve um pequeno lucro porque a venda do Lucas segurou a onda lá pelos lados do Morumbi;
- O Corinthians teve a maior receita (embalado por título da Libertadores e Mundial, aumento das cotas de TV, etc) mas uma lucratividade baixíssim: 2,1%. Se algum Einstein das finanças quisesse fazer um Value Based Management nos co-irmãos, mandaria fechar a operação do futebol porque ela não remunera o capital do acionista;
- Outro que é citado na matéria como case de sucesso, o Internacional, teve receita de 4,5%;
- O Santos, citado como referência pelo caso Neymar e o aumento de receitas: lucratividade de 7,5%; 
- O Grêmio, maior lucratividade entre os grandes (12%);
- O Atlético PR foi o campeão da lucratividade com 57% (!!!); como meu boné de campeão da Copa do Brasil 2012 se o resultado não foi turbinado com a venda de algum jogador.

As perdas:
Atlético MG, Cruzeiro, todos os times do Rio de Janeiro. Alguns por ineficiência administrativa, outros por falta de massa crítica de clientes (torcida pequena, pronto, falei), outros por estarem num mercado pouco atraente e com isso menos valorizados do ponto de vista de patrocínio. 
Mas todos eles têm algo em comum: investiram para formar um time forte. 

***

Aí entra a segunda parte da matéria. O caso Arsenal. 
Uma matéria dentro da matéria principal intitula-se "Austeridade tem limite". 
Conta rapidamente o caso do Arsenal, que há 8 anos não ganha um título no futebol inglês. Sob o comando do francês Arsène Wenger há 17 anos, o time é gerido com uma disciplina enorme em maximizar o lucro. Desde 2007 acumula lucros de mais de R$ 600 milhões. Seu último título foi em 2004. Eles têm um dos mais modernos estádios do mundo. A torcida insandecida tem um dos cantos no estádio o refrão: "Spend some fucking money" (algo gentil como "gaste a porra do dinheiro").

A neurose por gerar lucro é tão grande - o "management" possui uma ferramenta ou modelos matemáticos que identificam o melhor momento de vender um jogador - que em 2012 venderam o ídolo e artilheiro da Liga Inglesa em 2012, Robin van Persie , para o ... Manchester United. Van Persie foi artilheiro de novo e desta vez campeão no Manchester. Pelo menos o francês vendeu por uma boa grana e não por um punhado de emprestados. 

Segue o jogo.

***

Conclusão: conclusão?
Futebol é um negócio de risco. O Corinthians, com Libertadores e Mundial, teve 2% de lucratividade. Se Diego Souza acertasse aquele chute talvez hoje o Corinthians estaria com um balanço vermelho.
Esse é o futebol. Arriscar, ter ambição, pensar grande. Profissionalizar e se cercar de pessoas competentes, e não de políticos da velha guarda.
Sem dúvida que a austeridade financeira é importante. E honestidade, porque o futebol é um ralo de dinheiro mal gasto.
Mas primeiro tem que crescer. Isso é gestão moderna, ambiciosa.

Ah, mas estamos sem dinheiro. 
Nós e todos eles. Dívida você negocia. Se anteciparam receitas até o século 22, vai lá e negocia com Globo, Marco Polo, e Marin. Todos fizeram isso. Nenhum chorou. Assim como o Flamengo, cheio de dívidas, aplicou uma gestão austera, mandou o Love embora, mas não passa recibo sobre sua situação financeira. Não chora em público. Pelo contrário. Vai lá e fecha com a Caixa. Traz a Adidas. E assim mostra que a situação financeira é ruim mas é momentânea. O clube é maior que tudo isso.

Ou então... use o exemplo do Arsenal. Ou do Atlético PR.
É isso que queremos?

***

O resultado deste sábado contra o América MG é ruim mas para mim é o menos importante. O Palmeiras vai subir, mesmo com esse arremedo de time. 
O problema é que perderemos mais uma chance histórica. Se tivéssemos montado um time para sermos competitivos na Libertadores e no Paulista, passearíamos na Série B e teríamos chance na Copa do Brasil. Vamos subir, porque os outros são muito piores do que nós. Mas não será tranquilo como merecíamos.

Isso porque se planejaram "só" para a Série B.
Que faaaase....


***

Muito predador? Acho que não.
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Saudações Alviverdes!
  
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