quarta-feira, 5 de junho de 2013

Muitos tentam combater as leis que buscam moralizar a gestão pública e o trato com o dinheiro do povo

Há 21 anos, em 3 de junho de 1992, integrava-se ao ordenamento jurídico nacional um instrumento fundamental para o combate à corrupção e à malversação do dinheiro público: a Lei de Improbidade Administrativa (nº 8.429/92). Em pouco tempo, tornou-se o mais eficaz diploma legal na luta contra o patrimonialismo e o mau uso da coisa pública.
As dificuldades burocráticas e funcionais enfrentadas na aplicação da lei penal eternizam as ações criminais nos tribunais brasileiros. O que abre caminho para chicanas e proselitismos desmoralizadores do sistema repressivo do Estado. Essa realidade sofreu uma fratura benfazeja com a Lei de Improbidade, animando a todos os partícipes de um modelo novo e saudável.
Sua eficácia teórica, entretanto, nunca conseguiu ser atingida. Não foram poucos os que combateram ferozmente a legislação no intuito de evitar suas sanções. Tampouco o Poder Judiciário colaborou para que a Lei de Improbidade Administrativa lograsse o objetivo de tornar-se um remédio perdurável contra a corrupção.
Muitos tribunais simplesmente não julgavam as ações de improbidade e, quando o faziam, o destino comum era o arquivamento por questões processuais. As mais diversas teses jurídicas se levantaram sobre o alcance da lei: quem estava a ela submetido? Os agentes políticos, ou só os chefes de repartição? E as autoridades com garantia de foro especial?
Centenas de livros e artigos foram escritos, deliciaram-se os teóricos, indignaram-se os retrógados, divergiram os julgadores de todas as instâncias diante da insistência do Ministério Público em favor da nova legislação.
Agora, aos 21 anos, a Lei de Improbidade ganha novo fôlego. O estabelecimento da Meta 18 do Poder Judiciário tem tudo para tornar a legislação eficaz de fato, o que garantirá eleições mais qualificadas já em 2014. Pois a efetividade da Lei de Improbidade está intimamente conectada ao sucesso da Lei da Ficha Limpa.
A Meta 18 impôs um objetivo ambicioso ao Judiciário: julgar até o fim deste ano todas as ações de improbidade distribuídas antes de 31 de dezembro de 2011. Para lograr êxito, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se aliou à Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) para oferecer à magistratura o conhecimento necessário para lidar com os processos – estimados em 46,4 mil pelo CNJ.
Neste dia em que a lei alcançou sua “maioridade plena”, a Enfam iniciou a segunda edição do curso a distância sobre Improbidade Administrativa. Elaborado por magistrados especialistas em Direito Público e Processo Civil, a capacitação atraiu uma quantidade enorme de juízes na edição inaugural, o que nos obrigou a quadruplicar as vagas.
Nesta segunda edição, o roteiro se repetiu. Quatro dias antes do prazo de inscrições, todas as 200 vagas estavam preenchidas. Enquanto diretora-geral da Enfam, confesso-me surpreendida e feliz com a iniciativa de juízes de buscar qualificação para melhor desenvolverem suas atividades judicantes e dar um basta à cultura da impunidade dos que violentam, por corrupção ou incompetência, a administração pública.
O curso, realizado a distância, procura fornecer todas as ferramentas para auxiliar os magistrados em suas reflexões. Aprendem sobre o cenário de construção da improbidade, a tipificação do ilícito, os agentes passíveis de responsabilização direta e indireta, o dolo e a culpa, as sanções e sua dosimetria, e a prescrição. Também recebem conhecimentos processuais: validade das provas, prerrogativas de foro, defesa prévia, juízo de admissibilidade, instrução probatória, entre outros temas essenciais para a elaboração juridicamente precisa das decisões.
Essa sede de conhecimento dos juízes é a demonstração inequívoca de que à magistratura não interessa a conivência com a corrupção e a perpetuação da impunidade. Vejo nesses magistrados mais do que perseverança em adquirir a confiança intelectual. Eles buscam o sentimento de comunhão, consubstanciado na atitude de seus pares, no combate a essa praga que há tempos compromete nosso desenvolvimento social e institucional.
Por Eliana Calmon, ministra do Superior Tribunal de Justiça

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